
André Kertész (Budapeste, 1894-1985).
São os sons que amanhecem os olhos. Os menores. Os grudados na massa das casas. Que só se aumentam para acordar viventes desavisados. Eles me acordam e eu vou até a mesa, até a cozinha ainda feita dos sons sem tempo. A suspensão diante da mesa, esse pequeno não-tempo do meu acordar, é tão povoado das coisas menores que me perco no tumulto. Quando minha mãe espreguiça no corredor e me vê pequena, parada diante da mesa sem toalha, me olha como se eu fosse sonâmbula, como se eu não fosse quem eu sou. Mas aí eu olho pro rosto dela e digo alguma coisa curta e baixa como os sons que acordam meus olhos e ela volta a me olhar como se eu fosse eu. Da matéria que ela usou pra me fazer. E sendo outra vez familiar, ela deixa o assombro voltar pro lado de dentro das órbitas, deixa as pálpebras caírem até o meio dos olhos claros, feitos vítreos pela luz da janela, e me dá o olhar suspirado de quem ainda tem que fazer meu café. Eu desgosto dessa volta.