Descontínuo Reverso

Fotografia: Chema Madoz (Espanha, 1958).

domingo, 11 de novembro de 2007

Leontina 2

Foto: Man Ray (Estados Unidos, 1890-1976).

Ver Pensamento, tudo que a mente frutifica: http://pensas.blogspot.com/


Antes do violino cessar, Antonio batia na porta os dois toques curtos, e a Leontina que atendia tinha já os olhos de entrega que ele bem conhecia. E sorria doce do jeito que não costumava ser. Então ele tirava o chapéu de feltro verde escuro e o pendurava no espaldar da cadeira, junto da toalha molhada. Jogava o paletó na poltrona enquanto Leontina tirava as nêsperas - que era um dos tantos mimos constantes que ele lhe trazia - do pacote de papel pardo, e as arrumava, as quatro, no criado-mudo ao lado da cama, junto de um pequeno baú de madeira que era mantido sempre vazio.
Antonio foi surpreendido pelo gostar daquela mulher quieta e séria à braveza, que primeiro lhe foi rude, pra só depois aceitar a rosa única que ele ofereceu já na iminência de desistir, com a frase dita a seco, em seu tom monótono: Sua teimosia junto com o desenho das sobrancelhas me aproxima de Gaetano. Acostumou, não sem antes se bater inutilmente com seu orgulho, ao convívio com o segredo que o silêncio dela guardava e que os olhos tentavam alcançar quando no desespero do amor, fugiam dos seus e fixavam o pequeno baú vazio. Disse a Leontina uma única vez de seu desejo de casar, e a resposta foi no mesmo tom da primeira: não. Apesar de querer insistir, se conteve por saber que ela lhe falaria com sua tranqüilidade áspera o que já sabia, e preferiu não ouvir todas as letras, a história toda, e continuar ali com ela, da maneira inventada por ela de através do amor dele, amar outro homem.

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